sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Coca-cola nos lábios

Eu estava morrendo de sede, saí correndo do trabalho naquela tarde pra cobrir um acidente fora da cidade. Parecia que tinha morte, então era importante. Pra quem trabalha em jornal, por mais cruel que seja, quando acontece uma tragédia, a gente sabe que tem um prato enorme pra cidade no dia seguinte. E escrever sobre essas coisas motiva porque a gente sabe que todos vão querer ler. O povo adora uma tragédia. Eu queria parar o carro num bar qualquer pra tomar uma coisa, mas não conseguia. E o telefone tocava, mais gente avisando do local. “Vem pra cá, tem sangue por tudo”, diziam. A essas alturas eu já imaginava que era um massacre. Que nada, uma curva depois, aquela cena normal de acidente, apesar de ser no interior. Um mundaréu de gente em volta do corpo de um pobre coitado que foi atropelado por uma moto e uma menina que parecia estar na carona. Depois que comecei as entrevistas, descobri que a guria tinha sido sequestrada pelo cara da moto (que estava agonizando esperando socorro). Vi que precisaria entrevistar ela, e o melhor seria que fosse antes de ela ser levada pela ambulância. Crueldade, mas era meu trabalho, então tinha que ser profissional. Enquanto o cara não morria, falava com as pessoas na beira da estrada pra ver se alguém tinha um copo de água e pra minha felicidade, nada... Desisti de matar a sede e fui fazer umas fotos do cara no chão. As pessoas gritavam para eu terminar de matar o cara, que era um bandidinho conhecido na região. A gente aprende a lidar com os sentimentos pra não se envolver emocionalmente com a história na hora de escrever, mas não dá para dar o mesmo espaço para um assassino e para a família da vítima, por exemplo. A minha sede não passava e do lado do corpo do morto eu vi uma garrafinha de Coca-cola, se esvaziando. Puxa vida, que vontade que deu de arrancar aquela garrafa dali, mas os policiais não iam deixar. Passou um tempo e ouvi que a ambulância vinha chegando. No meio do barulho, o cara se entregou. Acho que foi o flash que fiz na cara dele que ajudou até, vai saber. Bom, eu tinha que entrevistar aquela guria. Aliás, era uma menina linda, uma bonequinha, bem vestida, cabelos compridos. Falei com o cara da ambulância que era meu chapa e consegui voltar com eles, pedi pro motorista voltar sozinho pro jornal. Enquanto aquela porcaria de camioneta velha chacoalhava, eu ia fazendo as perguntas pra guria. Uma hora, ela pediu pra eu segurar ela num abraço por causa daqueles solavancos. Bah, fiquei pertinho daquela boca e não aguentei aqueles olhinhos verdes me provocando. Tive que beijar aquela boquinha. Achei que ia tomar um tapa, mas ganhei outro beijo, agora mais apaixonado. O melhor era aquele gosto que matava a sede. Era um gostinho de Coca-cola.

2 comentários:

Jimi! disse...

ksoakospaopospaopsaosa bela forma de matar a sede!

Equipe A voz da vez disse...

concordo q eh uma bela forma de matar a sede...mas a coca cola tava gelada? auhuahuahah...kra otimo texto, parabens