Foi em um boteco de esquina, antes de um jogo de futebol que esta história foi contada com riqueza de detalhes. Dizia um senhor, do alto de seus sessenta e poucos anos, que a política sempre reservava boas pérolas que perduravam por anos. Aquela, iniciava ele, havia acontecido em uma pequena cidade do interior gaúcho, na noite que antecedeu a eleição municipal.
Foi uma das mais disputadas da história daquele município, com candidatos caricatos e extremamente diferentes em suas ideologias e capacidades. Como qualquer eleição, disse ele, venceu a melhor promessa, ou a que havia sido melhor trabalhada na televisão e nas ruas, diretamente com o povão. A imprensa apelidou o episódio de “acordo de cavalheiros”. Era uma noite fria, gelada e todos os cabos eleitorais estavam cansados das brigas e perseguições dos dias anteriores. Foi então que os generais dos partidos resolveram ligar para seus adversários, que na verdade eram amigos pessoais. A eleição tem o poder incrível de separar irmãos, o futebol não chega a fazer isso de forma tão forte. Naqueles telefonemas, nasceria o acordo de cavalheiros. Em meio a risadas, o velho tentava imitar a voz de um dos generais dos partidos, como se tivesse participado do chamado acordo eleitoral.
Foi mais ou menos assim “olha, o pessoal tá cansado e amanhã essa hora já vamos saber quem ganhou e quem perdeu. Então, que tal dar um gás final na campanha e todo mundo pode entregar os presentes nas ruas?”. Todo mundo caía na risada esperando o desfecho da história. O homem pegava no copo de cerveja e deixava todos angustiados, esperando os próximos detalhes. Depois de engolir a cerveja, continuou. “Foi uma correria, era rancho sendo entregue em tudo que era lugar. Tinha cabo eleitoral dos dois partidos largando na mesma rua e se cumprimentando. Era uma farra nos bairros mais pobres. O pessoal que optou pelo tradicional galeto para comprar votos se deu mal, faturaram poucos eleitores naquela noite”. Mas a gargalhada geral viria mais tarde, quando o homem contou que mesmo um ano depois da eleição, ainda havia candidato derrotado com mais de 100 quilos de galeto e carne bovina guardados em casa. “Um exemplo clássico da falta de logística e mau assessoramento na campanha”, terminou o homem. Fiquei pensando nesse acordo de cavalheiros, mas não entendi ainda por que a Justiça não fez nada mesmo a imprensa tendo conseguido fotos, gravações e detalhes do que aconteceu, material que também teria sido levado pelos partidos derrotados. Comentei essa dúvida com o velho contador da história e ele simplesmente disse: “Brasil, meu jovem”.
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