sábado, 31 de dezembro de 2011

Hora de apertar o reset

Época de transição, de esperança renovada, não é só mais um dia, é o último dia e o primeiro dia. É uma data única, esperada, comemorada, com todo o marketing possível que se possa imaginar para a data. Os corações estão de certa forma mais propensos à fraternidade esquecida nos outros 364 dias do ano. E enquanto erguemos nossas taças de champanhe e brindamos com nossos entes queridos, do lado de fora do conforto de nossas casas, alguém vasculha o lixo por um resto de qualquer coisa que possa ser dado a um filho.

Mas por que lembrar isso em um momento como esse, de comemoração, de extrema alegria? Por quê? Não sei, talvez seja apenas uma falsa preocupação, mas se fosse mesmo nem estaria escrito. Eu deveria comemorar, e vou. Eu deveria erguer os copos, e vou. Mas pessoalmente não consigo ter uma felicidade plena se sou obrigado a assistir cenas como essas. É só nesse momento, de reflexão, que isso aparece, porque depois a alegria mascara qualquer tipo de grilo que pintar.

É hora de dar o reset, de contabilizar o que fizemos de memorável e de se cobrar pelo que não foi alcançado. De estabelecer novas metas e talvez até renovar velhos compromissos, para fazer valer as velhas promessas. É hora de virar a página com a curiosidade de quem precisa descobrir, ansiosamente, o que acontece depois desse ato. Momento de caminhar com cuidado, mas com a segurança de quem sabe para onde está indo. Hora de dar o reset e apagar da memória os erros, mas ter a noção de que eles existiram, para que não sejam repetidos.

Dá para acreditar que agora vai ser diferente, que aquelas dificuldades não vão vir como chuvas na praia acabando com nosso humor. Não há problema em desejar que tudo continue igual, embora a conformidade não tenha nunca mudado o mundo. Hora de iniciar rebeliões, de se juntar a qualquer causa que transforme sua vida, de não ter medo de enfiar seu corpo na frente da tropa de choque e responder aos tiros com sorrisos. Você não vai mudar o mundo, nem mesmo ser lembrado como um revolucionário e ter seu nome escrito nos cadernos de história. Mas vai poder dizer, com orgulho: “eu tentei”. Então, tente, nem que seja seu último esforço, avance, nem que seja seu último passo, erre, mesmo que seja a última queda, mas aprenda, pois nenhuma lição será a última.

sábado, 24 de dezembro de 2011

Crônica da vida romântica

Na primeira vez, você manda flores para mostrar algum romantismo que no fundo ainda não tem. Mas você precisa apagar a fama que a maioria dos homens possui. Então acaba cedendo a esta necessidade. Até nem se importa de caminhar algumas quadras expondo o buquê ao público. De alguma forma, aos olhares alheios, você até parece sedutor com sua barba por fazer e o casaco do terno da noite passada, simplesmente atirado sobre uma camiseta branca.

Talvez até reparem que você não usa aliança e sintam uma ponta de inveja. Pronto. Levar este buquê já se compara a marcar um gol em final de campeonato, ele realmente chama a atenção. Ainda mais porque você nunca economiza dinheiro nas primeiras flores, por mais que saiba que elas acabarão adornando um canto da casa dela que nem será visitado.

No início, você até abre a porta do carro e conversa com ela com frequência. No fundo, está envolvido tanto quanto aprecia aqueles filmes de ação. Não há esforço para parecer romântico, simplesmente vai acontecendo. Torpedos e mensagens na internet, jantares e festas, risos e você nem se importa se há uma dezena de garotas com shorts minúsculos dançando a poucos centímetros de distância.

Ela não liga muito para toda essa atenção. Experiente, a vida a ensinou que você vai agir assim até arrancar exatamente o que precisa. Talvez seja essa sua vontade, por que não? Um pouco de diversão sem compromisso pode ser muito sadia. Afinal, você se sente mais à vontade quando pode se esbaldar e não precisa acordar cedo no dia seguinte para trabalhar. É uma comparação imperfeita, vamos admitir.

Se o amor fosse um trabalho, namorar seria ter carteira assinada. Viver de bicos seria essa coisa de ficar sem compromisso. O lance é que quando você é demitido, fica aquela dor. Se não se encanta com o trabalho, é fácil procurar outro emprego nos classificados. Ficar desempregado, digo, solteiro, pode ter lá suas vantagens. Bom seria se a crônica da vida romântica não fosse continuada como um livro de um só estilo, mas repleta de nuances como comédia, drama, romance, aventura, suspense. E ela é, mas só no início.

Depois, com o passar do tempo, se você sair para a rua já com sua aliança e seu andar preocupado com um buquê de flores, aquelas mulheres que ainda podem te desejar acabarão pensando que você é um animal. O melhor amigo do homem, mas nesse caso o mais detestado pela mulher: “seu cachorro”, elas vão pensar. No mínimo você só está carregando flores para minimizar alguma burrada que fez. É assim que o mundo acaba se tornando óbvio demais, porque embora você admita que não é perfeito, em nenhum momento prometeu que conseguiria ter um casamento como se fosse um eterno namoro proibido.

Mas e daí, em sua consciência você sabe que as flores estão sendo levadas somente para comemorar mais um ano ao lado do seu amor. E você também escreveu no bilhete um recado apaixonado, e não um pedido de desculpas por uma pulada de cerca. E a sua mulher sorriu, e agora é só isso que importa. Afinal, no início, havia muito romantismo. E você nunca prometeu continuar com ele, mas também jamais parou.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Ficou difícil ir ao cinema

Olha aqui, meu benzinho, vai dar aquele filme de ação que eu queria ver no cinema a semana que vem. Vamos lá?
Ele perguntou enquanto dava sua tradicional lida matinal nas notícias da cidade.

Ah, pode ser, faz tempo mesmo que não saímos. Você não me convida pra mais nada, só tem tempo pro trabalho.
Ela respondeu enquanto limpava os pratos da janta da noite anterior, resmungando que a louça era dele naquele dia.

Mas, benzinho, se não fosse pelo trabalho, nem poderíamos ir ao cinema. Nem para ver aquela baboseira do Brad Pitt que você quis assistir aquela vez.

Olha, Carlos Roberto, não tenho culpa se você não tem sensibilidade pra apreciar um bom romance, que grosseria. E nem vem falando porque isso foi há quase meio ano. Você não me convida para mais nada, insistiu ela.

Ah, Lilian, você também não se arruma mais, disse ele com a voz abafada, talvez para esconder a queixa.

O que foi que você disse, Carlos Roberto?

Eu nada, benzinho. Perguntei se vai querer ir ao cinema... Desconversou.

Uma semana depois, faltando 20 minutos para o filme iniciar, eles ainda estão em casa. Carlos Roberto angustiado reclama.

Benhê, pode dar uma apuradinha no banho, o filme já vai começar e você sabe como é o trânsito.

Ai, Carlos Roberto! Vamos com calma, ainda preciso fazer chapinha.

Mas o seu cabelo está lindo assim. Por favor, não quero perder o início do filme.

Ah, claro né, Carlos Roberto, mas eu posso estar feia, desde que você não perca nada desse filme estúpido cheio de explosões e gente morrendo. Qual a graça disso?

Então, esse atraso é proposital, Lilian, é isso? Você está fazendo isso por algum tipo de vingança? Por que não me disse antes que não queria ir que eu dava um jeito?

Como assim dava um jeito, seu sem vergonha? Ia sair com outra por acaso, com alguma vagabunda lá do teu trabalho?

E assim eles continuaram discutindo, inutilmente, por horas.

Logo depois, acabaram assistindo o velho DVD de Titanic que haviam guardado para os momentos de crise. E se amaram até o amanhecer. Ele não foi trabalhar no dia seguinte. Mas Lilian não se queixou, ela só queria ficar um pouco junto de seu marido como acontecia depois de toda vez que iam ao cinema.

domingo, 11 de dezembro de 2011

O que nos esquecemos de fazer

Um agradecimento, um sorriso a mais, agir com delicadeza, educação, ser prestativo e atencioso. Agir com uma ingenuidade curiosa, como quem descobre o mundo pela primeira vez, sentindo prazer nas coisas mais simples. Há uma série de pequenas coisas que nos esquecemos de fazer e que tornariam nossas vidas mais intensas, verdadeiras e talvez mais completas. As pessoas mais encantadoras que conheço tratam a todos como se fossem seus familiares, ou como novos amores – sempre tentando agradar e destacando nossas qualidades, opinando sobre nossos dramas e aumentando nossa felicidade.

Essas pessoas eu chamo de amigos. Outros fazem o favor de menosprezar nossas conquistas, debochar de nossos sonhos e trair nossa confiança. Essas pessoas são as que somos obrigados a tolerar e, se formos extremamente pacientes, tentaremos as tratar como gostaríamos de sermos tratados. Mas é difícil, admito. Beijar todos os dias como quem nunca sentiu o gosto dos lábios de seu amor, abraçar um amigo como se este estivesse ausente há muito tempo, dizer que ama seus pais, falar ao seu amor o quanto é feliz pela sua presença. Valorizar o vento, saborear até a água, essencial para a vida, tomar banho de rio como uma criança, rolar na areia, cair e ralar os joelhos.
Assim como há muito tempo não nascia inspiração para atualizar este blog, notei que também há alguns meses esqueci esses pequenos detalhes que nos tornam mais humanos, e humanos mais apaixonados pela vida. E apaixonados por todas essas coisas maravilhosas que o mundo nos mostra todos os dias. Pequenos detalhes como não deixar de fazer nada só porque alguém pode achar isso cafona, como sorrir no meio da multidão, ou cantar no meio da rua mesmo, como se apenas isso fosse importante, porque naquele momento, é só isso que vai ser importante mesmo. Muitas vezes, nada é maior do que você e a solidão dos seus fones de ouvidos e suas músicas selecionadas para lhe tirar de um dia ruim, para lhe absorver de uma realidade incômoda e lhe transportar a um lugar de paz. Isso tudo porque às vezes nos esquecemos de pequenas coisas, como viver...