quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

O flerte

Ela ajeitou o sutiã, preto, que aparecia delicadamente sob o vestido. Seria uma senha, um pedido para que deixasse de olhar para aquele decote generoso como o salário pago aos deputados brasileiros? O vestido, um pretinho básico, era provocante delineando curvas sinuosas e perigosas que poderiam levar a um abismo. Ela falou daquele jeito desinteressado como mulheres com muita autoconfiança fazem, nos deixando estarrecidos num misto de encantamento e surpresa.

“Olha, querido, eu gosto que você se interesse pelo meu corpo, mas poderia prestar atenção nos meus olhos também?” É claro que isso me desconsertou completamente, não há resposta boa o suficiente para um tapa sutil como esse, acompanhado de uma leve passada de mãos nos cabelos para soltá-los ainda mais e aquela pose pensativa, como quem segura um óculos imaginário. A saída seria interromper o jantar, puxar aquela mulher pela cintura no melhor estilo José Mayer e carregá-la para meu carro, para o apartamento e para a cama.

“Eu sei que você está pensando em inúmeras formas de me convencer a... Mas seja sutil”. Não deu tempo, apesar da mensagem negativa, havia uma clara manifestação de interesse, mas por que eu estava hesitante? Ainda mais com aquele desenho na minha frente, um olhar desafiador me intimidando. O incrível é a velocidade com que pensamos em uma situação dessas, até porque pela descrição parece que fiquei inerte por minutos. Não foi assim.

Peguei o copo de uísque e olhei para os olhos dela, assim como havia me pedido. Permaneci a encarando ao largar o copo sobre a mesa, deixando propositalmente uma pausa dramática para dizer – “Pronto. Esta deve ser a quarta dose que bebo. Graças a ela, segundo os estudos, eu posso não estar mais no pleno exercício das minhas ações. Talvez eu não lembre amanhã desse nosso encontro, mesmo que eu veja você dormindo ao meu lado. Mas imagino que se isso acontecer, vou achar você ainda mais linda do que nesse momento. E isso não significa que seu vestido não seja incrível e você não esteja maravilhosa agora, inclusive me apaixonei pelo seu olhar, mas seu corpo me provoca. Perdoe-me se valorizo mais o decote. Não fui eu quem escolheu vestir essa roupa, mas terei imenso prazer se puder tirá-la”.

No dia seguinte, olho para o lado e ela não está. Ainda meio zonzo, fico pensando se exagerei quando falei aquilo tudo assim, do nada. Levanto para me lavar e a porta entreaberta do banheiro revela a escultura que havia trazido para casa. Não, não houve exagero nenhum.

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