Havia devorado um livro do LF Verissimo pouco antes de pegar
no sono. O dia inteiro tinha sido cansativo, daqueles que é proibido
desconcentrar para não perder o pique. Só teve uma saída para buscar um lanche
e foi quando achei graça da minha estupidez. No mercado, vi uma menina
sorrir ao me notar chegando próximo do caixa. Ignorei, não havia por que ficar encarando. O tempo passa por qualquer problema
na análise do preço das compras dela e eu fico assistindo àquela cena e de
repente ela me dá oi e fala meu nome. O problema era não lembrar nem ter
qualquer noção de quem poderia ser a garota. Mas isso tudo foi bem antes de
pegar no sono e não tem tanta relevância assim.
De repente percebi que nasci em um mundo onde precisava
indicar minhas opiniões, assumir um lado, escolher uma cor e determinar meu
padrão de comportamento. Um caminho é o certo, o outro o errado, me disseram. “No
primeiro, com muito esforço tudo pode dar certo, mas sempre existe a
possibilidade de sair tudo errado. No segundo, tudo está inclinado a dar
errado, mas com sorte pode dar certo”. E foi aí que fiquei me perguntando quem
afinal determina o que é certo ou errado. Se não há provas reais da existência
do Deus que prega o marketing da Igreja, é possível que o certo tenha sido criado
por alguém errado. Isso pressupondo que esse Deus seja perfeito e que Ele, sim,
poderia dizer o que é certo e quem está errado.
Aí Jesus apareceu na minha frente, disfarçado é claro. Mas
eu notei que era Jesus. Como bom jornalista que sou, seria impossível não ver
que Jesus estava ali, de pé à minha frente, mandando que eu continuasse
escrevendo. “Você escreve o que é certo e você escreve o que é errado, depois
lê e escolhe. Isso é a vida, Deus não vai te condenar por nada”. Aí perguntei
sobre as leis que preciso cumprir e disse achar exagerado tudo o que a Igreja
prega. Jesus só deu um risinho e disse para eu parar de pensar na menina que havia
visto no mercado e me concentrar em escrever.
E do nada, ele sumiu e me vi em uma sala repleta de livros. Havia uma
fila imensa esperando para entrar onde eu estava. Com livros nas mãos. Era o
lançamento de mais um livro, e isso havia ficado tão corriqueiro que nem dava
mais importância quando me diziam o quanto as minhas histórias haviam mudado
suas vidas. Só assinava o autógrafo e dizia o “obrigado”. Nem mais explicava
como havia sido pensar os personagens, estudar os cenários e estabelecer os
vínculos e caminhos da história. Eu fiquei preocupado mesmo só em receber o
dinheiro.
Agora, acordei e escrevi tudo isso. Acabei de ler. E fiquei
com medo de escolher o caminho errado.

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