terça-feira, 12 de março de 2013

Ainda não

Recebi um telefonema, era a morte. Me perguntou se eu estava a fim de assistir um show, seria do Renato Russo com o Chorão. Se juntaram pra fazer música. Falei que não tava preparado pra ver isso, mas ela insistiu dizendo que depois eu poderia ter aulas de direção com o Ayrton Senna, meu ídolo. Ainda assim, fiquei pensativo e não soube o que dizer. A morte quis me convencer que não estaria sozinho, diversos amigos e conhecidos estariam lá para curtir também os Mamonas e uma apresentação única da Amy. Mas eu fiquei com medo, porque uma vez lá, não poderia voltar dessa festa. Aí, a morte me convenceu dizendo: "teu pai está aqui também. Não sente falta dele?". Foi nesse instante que acordei e chorei, pra entender que sim, eu morreria pra ver meu coroa de novo. Mas ele jamais ia desejar isso, então eu espero, eu espero...

terça-feira, 5 de março de 2013

Pra sempre


O pra sempre é só um clichê que funciona. Eu não quero alguém pra sempre.
Quero alguém que esteja lá quando estiver chovendo e a cidade estiver um saco. Alguém que não fique o tempo todo por perto, mas que me ligue do nada implorando pra sonhar por aí. Não precisa fazer tudo por mim, mas entender que eu não quero conversar quando não estou legal.

O pra sempre é só uma promessa. Eu não quero alguém que faça promessas, para isso temos os políticos. Quero alguém que se faça presente nas festas, que agite comigo e me deixe entortar todas as garrafas durante a madrugada. Alguém que entenda meus erros, todos eles. E que não me perdoe.

Alguém que não vai estar para sempre ali do meu lado. Mas alguém que seja de verdade, crítica, parceira, engraçada, maloqueira, disposta a dançar no meio da rua, a falar com boca cheia, falar palavrões em público e dizer que não quer mais ficar comigo pra sempre, mas que apareça no outro dia para me dar um beijo. Mais um. Porque amar pra sempre é muita pretensão, e eu só quero que me abrace um pouco. Mais um pouco.

sexta-feira, 1 de março de 2013

O menino que não queria jogar bola


Não costumo voltar a pé de eventuais compromissos dessa vida jornalística. Talvez por isso eu esteja pesado demais (para não usar o termo gordo), mas enfim. Nesta sexta-feira, depois que fui até a Delegacia de Polícia para verificar se havia alguma ocorrência que merecesse registro, decidi retornar caminhando para a redação do jornal O CORREIO. Também para espairecer as ideias e refletir sobre alguns episódios desta semana. Além disso, o motorista estava em outro compromisso, blá, blá, blá. Telefonei, avisei e comecei a jornada de talvez um quilômetro até o edifício do Sistema Fandango de Comunicação.
Seria uma jornada rápida se meus olhos não tivessem parado na figura de um menino, que estava próximo a um prédio onde há uma dessas quadras para a prática de futebol de salão. Mochila simples às costas, no estilo sacolinha, um chinelo de dedos, camiseta de uma escola e uma bermuda preta. Segurava um pequeno caderno, daqueles de molinhas, os mais simples. Mas sua atenção estava dispersa. Como há um portão naquele prédio, atrás de uma das goleiras, ele assistia a um jogo de outros meninos, talvez da idade dele. Acho que ele deveria ter uns 12, 13 anos, não sei. Um moleque. A figura dele lembrava a de muitos guris com quem convivi no último ano na Escola Liberato Salzano Vieira da Cunha, nas oficinas de produção de jornal, onde fiz muitos amigos.
Cheguei perto do garoto, guardei a câmera no bolso. Eu poderia ter fotografado a cena de longe, só que não. Preferi ser egoísta guardando a imagem só na minha memória e também respeitar aquele momento do garoto. Curioso, tive de perguntar alguma coisa. “E aí, cara?! A fim de jogar uma bola com a gurizada ali?”. O menino se virou rapidamente, olhou para mim e sorriu. “Não, tio (eu não imaginei que estava tão velho)”. Logo, ele voltou a atenção para a quadra mais uma vez. E completou.
- “Eu adoro futebol, tio. Mas não jogo muito bem. E ali dentro eles cobram para jogar bola. Lá na vila a gente tem um campinho que dá pra fazer um ‘três dentro, três fora’ de graça e não iam falar nada se eu estivesse descalço. Eu não vou pagar pra jogar bola, tio. O dinheiro que eu ganhei vendendo uns chocolates na rua eu comprei esse caderno aqui, ó. Olha, tio. É do Homem Aranha, sabe aquele super-herói. E também, tio, eu não sou muito bom no futebol. Lá no campinho sempre me colocam de goleiro. Prefiro estudar, estou voltando da escola agora”, falou.
Respondi, sem falar nada, só acenando positivamente com a cabeça umas duas vezes. Tem horas que as coisas nos emocionam de uma forma que parece que uma faca atravessa nosso coração. A maturidade daquela criança me fez sentir isso. O menino não queria jogar bola, mas não tirava os olhos da quadra. Antes de sair dali, tentei consolar o moleque. “Eu também nunca joguei bola muito bem, cara. Aliás, nem goleiro eu era. Mas vou te deixar uma coisa”. Tirei do bolso a caneta que recém tinha usado para anotar informações.

- “Ó, pra ti usar na aula, cara”.

- “Ah, tio, não precisa. Olha, eu também comprei meus lápis com o dinheiro das trufas que vendi”.

- “Fica com ela, cara. Eu tenho outra lá no meu trabalho. E não vai muito tarde pra casa, hein”.

- “Relaxa, tio. Sei me cuidar. Muito obrigado”.

Eu me vi nesse moleque, por ter conquistado as poucas coisas que tenho pelo meu trabalho, e também, lógico, por amar futebol. E por uma lição que ele deu e que nada que eu escreva vai conseguir explicar.